domingo, 17 de junho de 2012

ONGs criticam rumos da Rio+20


IHU On-Line

Um espaço de crítica aos rumos que a Rio+20 está tomando, mas também de busca de alternativas. Assim a ativista Fátima Mello define a Cúpula dos Povos, evento paralelo à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável.
Coordenadora do evento, que reúne ONGs brasileiras e estrangeiras, ela critica o conceito de economia verde e a abertura do documento da ONU ao papel das grandes corporações na provisão de serviços globais. Mas defende a manutenção do princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas nas negociações sobre mudanças climáticas. "Acreditamos que os países responsáveis pelas emissões históricas mais elevadas têm maior responsabilidade, mas o texto da ONU tende a esvaziar esse principio", alerta.
A entrevista é de Guilherme Serodio e publicada pelo jornal Valor, 12-06-2012.
Eis a entrevista.
Como a Cúpula dos Povos se articula com a Rio+20?
O grande problema da Rio+20 é a tendência à privatização dos regimes, convenções e tratados internacionais no âmbito da ONU. Todas as conquistas que obtivemos desde a Rio92 correm o risco de se perder. Queremos que a conferência implemente essas conquistas e avanços em relação à garantia de direitos, justiça social e ambiental. Mas o que vemos é retrocesso e uma captura do sistema ONU pelas grandes corporações. Vemos que o texto da ONU tem armadilhas. Fala em "garantias de acesso" aos serviços através do Estado, mas cita parcerias público-privadas, abrindo espaço para as multinacionais se apoderarem deles. E, nesse caso, muitas pessoas não terão como pagar.
Como a sra. avalia o princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas?
É muito importante pois rege as negociações sobre mudanças climáticas, em que os países responsáveis pelas emissões históricas mais elevadas têm maior responsabilidade. Mas o texto da ONU tende a esvaziá-lo.
Isso é um risco muito grande porque um país como Ruanda não pode arcar com os custos de uma transição tecnológica. Mesmo porque não tem a mesma responsabilidade pela crise ambiental que Estados Unidos. O Brasil tem se posicionado em relação a isso. Os países do norte têm hoje suas economias baseadas em serviço e têm mais facilidade para fazer a transição para a economia de baixo carbono.
A crise global pode atrapalhar nas negociações sobre clima e sustentabilidade?
A crise global é um dos motivos das resistências para se avançar nas negociações de clima e em relação ao acordo global. O horizonte dos países desenvolvidos passou para o curtíssimo prazo. Já os emergentes querem manter as taxas de crescimento, não querem frear o consumo e resistem a compromissos para uma transição a outro modelo de produção e consumo. A conferência se realiza em um cenário desfavorável a compromissos mais profundos.
Caminha-se na direção de soluções simplificadoras, como a chamada economia verde.
Quais são as suas criticas à economia verde?
Assim como a Rio92 legitimou a ideia de desenvolvimento sustentável, que hoje caiu no vazio [porque cada um se apropria do jeito que entende], o conceito de economia verde corre o risco de legitimar a continuidade do atual modelo de produção e de consumo.
Somos a favor da transição para a economia de baixo carbono. Mas a fórmula que a conferência oficial oferece para isso é extremamente perigosa, pois não questiona quem ganha e quem perde.
E as bolsas verdes?
Se olharmos o relatório do Pnuma e o texto em negociação, é muito forte a ideia de se criar um mercado financeiro para os recursos da natureza. Já existem bolsas [de valores] verdes que precificam o ar e criam créditos de carbono, o chamado mercado de carbono. Isso, para nós, é falsa solução. O que estamos observando é que o mercado de carbono pode atuar contra os direitos das populações tradicionais. É uma armadilha.

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