sábado, 1 de outubro de 2011

A SOBERANIA DO DOM DA VIDA

Dom Washington Cruz, CP[1]
Muitas foram as manifestações, movidas pelas razões ou pelas paixões, relativas ao caso do aborto sofrido pela garota de Alagoinha-PE, no alto de seus meigos 9 anos de idade.
Entidades, pessoas individualmente, organizações sociais diversas manifestaram-se acerca daquele caso a partir dos diversos elementos apresentados pela imprensa. Poucos, é verdade, tiveram contato direto com o padrasto, com a mãe e com as garotas, de 9 e de 13 anos, que sofreram por três anos consecutivos os abusos sexuais dentro da própria casa.
A Arquidiocese de Olinda e Recife, Igreja à qual está vinculada a Paróquia de Alagoinha, manifestou-se a respeito deste fato e estimulou a CNBB a pronunciar-se oficialmente acerca do caso. Amparada não pelas leis do Estado, mas pela norma canônica, a excomunhão foi aplicada. E muitos se detiveram tão-somente no fato da excomunhão, em si. Porém, alguns elementos precisam ser apresentados e aprofundados.
Logo que o caso veio a público, o Conselho Tutelar de Caruaru, acompanhado pelo Pároco de Alagoinha, da mãe, do padrasto das garotas e de um grupo de pessoas, fez toda a avaliação sobre o caso e manifestou-se formalmente contrário à interrupção da gravidez, não obstante a pressão exercida por uma assistente social do Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIP), em Recife, conforme o relato oficial do Pároco que acompanhou pessoalmente o caso. O IMIP foi ao local para onde a criança fora levada a fim de ser submetida aos exames físicos e psicológicos. Ali, o Conselho Tutelar foi instado a assinar documento aprovando o aborto. Recusando-se a assinar tal documento, por razões cristãs, uma das Conselheiras preferiu levar o caso de volta para a cidade de Alagoinha e discuti-lo com o Conselho Tutelar. Novamente, unanimemente, o Conselho manifestou-se contrário à recomendação abortiva. No entanto, o comportamento da assistente social do IMIP frente ao caso, induzindo à realização do aborto, chamou a atenção dos pais, do pároco e dos conselhos tutelares. É de se notar que, segundo o pároco de Alagoinha, em momento algum os pais, a menina e a comissão que os acompanhavam foram recebidos por algum médico ou pelo diretor do hospital.
Após reunião havida entre o Arcebispo de Olinda-Recife, o Bispo da Diocese de Pesqueiras (onde está a Paróquia de Alagoinha), uma equipe de médicos, juristas e psicólogos, houve também posição unânime pelo desaconselhamento do aborto ante a existência de inúmeros casos de crianças gestantes que tiveram seus filhos de modo normal, sem terem vivenciado riscos de morte. Há pareceres médicos e legais, de séria competência, que fundamentaram os posicionamentos daquele grupo. O Diretor do IMIP, chamado para uma reunião, após saber da análise feita pela equipe ligada à Igreja, imediatamente telefonou para o hospital desautorizando qualquer procedimento abortivo. Até mesmo o Desembargador Presidente do Tribunal e outros Juízes do Tribunal de Justiça de Pernambuco, após encontro com algumas pessoas e com os pais da menina, pediram pela preservação da vida das crianças que aquela pequena gestante trazia consigo.
Mesmo ante essas recomendações de não se fazer o aborto, os pais da menina gestante foram pressionados por uma entidade chamada “Curumins”, de mentalidade feminista pró-aborto, juntamente com técnicos da Secretaria da Saúde de Pernambuco, a assinar “alguns papéis”, como de forma ansiosa a mãe da criança relatou. Estes papéis autorizavam a transferência da criança do IMIP para outro hospital especializado em gravidez de risco. Naquele hospital, porém, o aborto foi realizado. Certamente, em momentos tensos, de forma rápida, pessoas interessadas em cultivar o espírito de “liberdade” frente ao chamado “livre arbítrio” de manter a vida ou de matá-la, coletaram assinaturas da mãe naqueles papéis, sem que a mesma, talvez, tivesse plena consciência do seu conteúdo.
O Pároco de Alagoinha, que acompanhou dia a dia a via crucis daquela família, relatou pormenorizadamente todo o ocorrido. Em conversa com o pai e com a mãe da menina, o Pároco atestou que ambos manifestaram-se claramente desfavoráveis ao aborto, posição esta que consolidou e confirmou ainda mais aqueles pareceres do Conselho Tutelar da comissão constituída pela Igreja.
Em Nota Oficial, a CNBB afirma que a Igreja, “em fidelidade ao Evangelho, se coloca sempre a favor da vida, numa condenação inequívoca de toda violência que fere a dignidade da pessoa humana”. O ato violento sofrido pelas crianças, mãe e filhos, o qual deve ser devidamente apurado pelo Judiciário, não é motivo para se tirar do ventre de uma menina-gestante aquelas indefesas crianças, cujas vidas não corriam riscos, segundo os pareceres dos médicos que acompanharam o caso juntamente com a Igreja.
Até mesmo em caso de legítima defesa, a própria lei civil trata o ato de se tirar a vida com ressalvas, apurando a existência de possíveis indícios criminais. Qual legítima defesa poderia ser argumentada no caso do aborto feito em uma gestante de 9 anos, cujo risco de morte era inexistente? Imaginemos a possibilidade inversa, de a mãe e as crianças serem saudavelmente acompanhadas pela família, por instituição social idônea ou por alguma instituição religiosa. Imaginemos a possibilidade de que os filhos daquela pequena mamãe, não obstante terem sido gerados de modo impróprio, pudessem ter sido para ela, passadas todas as tormentas, pequeninos responsáveis por um novo sentido para a vida dela e dos seus. A esperança sempre existe. Matar pessoas humanas indefesas dentro do ventre de uma mãe, não lhes dando a chance de viver com a dignidade inerente aos filhos de Deus, é um ato extremamente desumano. Somente uma sociedade onde a vida equivale a um bem de consumo, o qual pode ser descartado a qualquer tempo, poderia defender a morte de uma criança e, mais grotesco ainda, a morte de uma pessoa em estado embrionário.
“Não matarás”. O mandamento divino é aplicável à vida humana em toda a sua extensão. Não matarás a pessoa concebida ou ainda em estado embrionário, não matarás as crianças já nascidas, não matarás os jovens, os adultos e os idosos. Além de ser um mandamento contido na lei de Deus, espera-se que qualquer pessoa, movida por quaisquer convicções éticas, filosóficas ou religiosas, também não mate outro ser humano.
Quando a vida está em jogo, quando matar o outro apresenta-se como a única possibilidade de expressão de uma determinada “liberdade de escolha”, havemos de concordar que não há, aí, o exercício de nenhuma autêntica liberdade. Escolher matar um ser vivo, moralmente, não expressa o livre-arbítrio que é próprio da condição humana. “Eis que hoje estou colocando diante de ti a vida e a felicidade, a morte e a infelicidade. Se ouves os mandamentos de Javé, teu Deus, que hoje te ordeno, viverás e te multiplicarás (...) Contudo, se teu coração se desviar e não ouvirdes e se deixardes seduzir e te prostrardes diante de outros deuses e os servires, eu hoje vos declaro: ´é certo que perecereis” (Dt 30,15-18).
A liberdade humana deve estar sempre e inteiramente a serviço da vida.

[1] Arcebispo de Goiânia. Dom Washington Cruz ressalta o compromisso cristão de defender a vida em todos os seus estágios. “Além de ser um mandamento contido na lei de Deus, espera-se que qualquer pessoa, movida por quaisquer convicções éticas, filosóficas ou religiosas, também não mate outro ser humano”, destaca o arcebispo. Leia o artigo na íntegra. Fonte: http://www.arquidiocesedegoiania.org.br/site/ultimas-noticias/519-artigo-do-arcebispo-de-goiania-em-defesa-da-vida.html  - 12de Março de 2009.

0 comentários:

Postar um comentário

Você Poderá Gostar:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...