Pio Penna Filho[1]
O vírus ebola começou a
fazer vítimas fora da África. Existem casos registrados nos Estados Unidos e na
Espanha. Nos Estados Unidos, já fez uma vítima fatal e é muito provável que
isso ocorra também na Europa e em outros lugares.
Curioso é que, apesar de diversos
alertas emitidos por Organizações Não-Governamentais, como os Médicos Sem
Fronteiras, sobre o perigo do vírus e a alta probabilidade de sua expansão, a
comunidade internacional reagiu e continua reagindo muito lentamente diante
dessa epidemia.
É possível que muitas
autoridades pensassem que dificilmente o vírus sairia da África. Ou seja,
enquanto estivesse restrito ao continente africano, o problema seria menor,
sobretudo porque a África é vista de forma marginal e preconceituosa em
praticamente todos os campos.
Mas agora o quadro está
evoluindo rapidamente. O contágio pode estar se processando fora da África,
tornando ainda mais difícil o combate e a contenção do vírus. E o agravante é
que nenhum país do mundo está, de fato, preparado para enfrentar o ebola. Nem
os Estados Unidos.
A situação em alguns países
da África Ocidental continua gravíssima, fora de controle. Serra Leoa e Libéria
continuam sendo os casos mais problemáticos. O ebola está no interior e também
nas capitais dos dois países, que definitivamente não possuem recursos para
quase nada.
No caso da África somente
uma ajuda externa consistente e bem planejada pode trazer alguma esperança para
encurtar o ciclo da epidemia, e isso certamente dependerá de muito dinheiro.
Caso contrário, os africanos terão que passar por mais essa prova de fogo, ou
seja, aguentar o tranco até que a natureza opere e a epidemia termine
naturalmente.
Não é preciso dizer,
contudo, que o custo disso, em termos financeiros e humanos, será extremamente
alto. E ainda persistirá o problema da disseminação da epidemia para outras
partes do continente e do mundo.
Na Libéria e em Serra Leoa a
situação é tão grave que muitos doentes não conseguem atendimento
médico-hospitalar em lugar nenhum. Ficam vagando de hospital em hospital até
que o retorno para suas residências é a única alternativa. Muitos morrem ao
relento, nas ruas, sem ajuda. O medo de contágio faz com que os últimos
momentos de suas vidas sejam pautados pela solidão e desamparo. Uma maneira
muito triste de terminar a vida.
Se, ou quando, o vírus
atingir outros países fora da África em forma de epidemia, só os Estados mais
ricos e organizados terão condições de fazer frente a essa tragédia sem que as
imagens de desespero que estamos assistindo na África se repitam.
No caso do Brasil, apesar
das autoridades de saúde dizerem que estamos preparados, no fundo todos sabemos
que isso não corresponde à verdade. O fato, a verdade pura e simples, é que no
nosso caso estamos muito distantes disso. A nossa saúde pública não dispõe de
recursos financeiros e humanos para controlar uma epidemia da natureza do
ebola.
Portanto, a forma mais
inteligente e econômica para o resto do mundo que ainda não foi contaminado
pelo ebola é olhar com mais atenção o que está acontecendo hoje na África e
ajudar as autoridades africanas na sua difícil luta contra o vírus. Ou seja, a
nossa apatia e desdém com o que está acontecendo com os africanos pode nos
custar muito mais caro do que pensamos.
[1] É
doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília
(UnB) e professor de História Contemporânea da Universidade Federal de Mato
Grosso (UFMT). É autor de artigos publicados no Brasil e no exterior sobre a
África e sobre a América Latina.
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