sexta-feira, 10 de outubro de 2014

A Expansão do Ebola

Pio Penna Filho[1]
O vírus ebola começou a fazer vítimas fora da África. Existem casos registrados nos Estados Unidos e na Espanha. Nos Estados Unidos, já fez uma vítima fatal e é muito provável que isso ocorra também na Europa e em outros lugares.
Curioso é que, apesar de diversos alertas emitidos por Organizações Não-Governamentais, como os Médicos Sem Fronteiras, sobre o perigo do vírus e a alta probabilidade de sua expansão, a comunidade internacional reagiu e continua reagindo muito lentamente diante dessa epidemia.
É possível que muitas autoridades pensassem que dificilmente o vírus sairia da África. Ou seja, enquanto estivesse restrito ao continente africano, o problema seria menor, sobretudo porque a África é vista de forma marginal e preconceituosa em praticamente todos os campos.
Mas agora o quadro está evoluindo rapidamente. O contágio pode estar se processando fora da África, tornando ainda mais difícil o combate e a contenção do vírus. E o agravante é que nenhum país do mundo está, de fato, preparado para enfrentar o ebola. Nem os Estados Unidos.
A situação em alguns países da África Ocidental continua gravíssima, fora de controle. Serra Leoa e Libéria continuam sendo os casos mais problemáticos. O ebola está no interior e também nas capitais dos dois países, que definitivamente não possuem recursos para quase nada.
No caso da África somente uma ajuda externa consistente e bem planejada pode trazer alguma esperança para encurtar o ciclo da epidemia, e isso certamente dependerá de muito dinheiro. Caso contrário, os africanos terão que passar por mais essa prova de fogo, ou seja, aguentar o tranco até que a natureza opere e a epidemia termine naturalmente.
Não é preciso dizer, contudo, que o custo disso, em termos financeiros e humanos, será extremamente alto. E ainda persistirá o problema da disseminação da epidemia para outras partes do continente e do mundo.
Na Libéria e em Serra Leoa a situação é tão grave que muitos doentes não conseguem atendimento médico-hospitalar em lugar nenhum. Ficam vagando de hospital em hospital até que o retorno para suas residências é a única alternativa. Muitos morrem ao relento, nas ruas, sem ajuda. O medo de contágio faz com que os últimos momentos de suas vidas sejam pautados pela solidão e desamparo. Uma maneira muito triste de terminar a vida.
Se, ou quando, o vírus atingir outros países fora da África em forma de epidemia, só os Estados mais ricos e organizados terão condições de fazer frente a essa tragédia sem que as imagens de desespero que estamos assistindo na África se repitam.
No caso do Brasil, apesar das autoridades de saúde dizerem que estamos preparados, no fundo todos sabemos que isso não corresponde à verdade. O fato, a verdade pura e simples, é que no nosso caso estamos muito distantes disso. A nossa saúde pública não dispõe de recursos financeiros e humanos para controlar uma epidemia da natureza do ebola.
Portanto, a forma mais inteligente e econômica para o resto do mundo que ainda não foi contaminado pelo ebola é olhar com mais atenção o que está acontecendo hoje na África e ajudar as autoridades africanas na sua difícil luta contra o vírus. Ou seja, a nossa apatia e desdém com o que está acontecendo com os africanos pode nos custar muito mais caro do que pensamos.


[1] É doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e professor de História Contemporânea da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). É autor de artigos publicados no Brasil e no exterior sobre a África e sobre a América Latina.

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